Mercado externo é que deve determinar o tamanho das próximas altas


O presidente da Quest Investimentos, Luiz Carlos Mendonça de Barros, acredita que apenas uma desaceleração externa poderá conter a escalada dos juros no Brasil. Com demanda interna superaquecida e aumento de gastos no governo, diz ele, o trabalho de contenção da inflação via política monetária demandaria, pelo menos, mais dois aumentos de 0,75 ponto porcentual na Selic, que chegaria a 11,75%.

Em caso de rápida recuperação da economia global, sua projeção é para uma taxa de até 13,75% até o fim do ano. “No que depender apenas da demanda interna, não tenha dúvida de que isso vai ocorrer.”

Como o sr. avalia a decisão do Copom?

O aumento de 0,75 ponto porcentual era esperada por todo mundo. A dúvida que se tem é sobre o tamanho total do aumento dos juros. E aí está muito na dependência da parte externa, se isso vai levar a alguma desaceleração de fora, como aconteceu em 2008. Essa é a dúvida. Tem gente que acha que é um total de 3 pontos porcentuais ? já foi dado 1,5 ponto e faltaria mais duas altas de 0,75 ponto. E tem gente que acha que vai ser mais, 4 ou 5 pontos. Isso é uma dúvida que o mercado tem e a questão é muito menos interna do que externa, porque o IPCA que saiu hoje (ontem), apesar de baixo, quando se expurga a parte de alimentos, que é muito volátil, o número está muito ruim. Então tem uma inflação de demanda clara que está bem acima de 6% ao ano. Então essa é a dúvida. Hoje (ontem) era dado como certo, como a próxima reunião também. A não ser que haja algum desastre, a próxima reunião do Copom vai aumentar em 0,75 ponto de novo.

O sr. está em qual dos grupos, mais para 3 pontos ou mais para 5 pontos?

Eu acho que, se lá fora não se criar um cenário de novo de muita aversão a risco ? porque aí para o comércio exterior, tem uma fonte externa de desaceleração da economia ?, se isso não acontecer, eu acho que o aumento total na taxa de juros vai chegar a uns 5 pontos pelo menos. No que depender só da demanda interna, não tenha dúvida de que isso vai ocorrer.

Então o sr. também concorda que a economia está superaquecida

Ah, sim, está superaquecida. Há dois canais importantes de inflação no Brasil. O primeiro é o câmbio, que está relativamente controlado. E o segundo é o mercado de trabalho, que está muito aquecido. Nós na Quest estamos esperando um desemprego no fim do ano da ordem de 6%. É coisa que nunca aconteceu no Brasil. E claramente é um mercado de trabalho fora do controle, por causa da desqualificação. A pressão hoje está sobre o mercado de trabalho mais qualificado. Os 6% de desemprego implicam que apenas o pessoal sem qualificação é que está ainda desempregado. Vai ter de brecar a economia via juros, já que a parte de gastos do governo continua fora de controle, os dados do PIB mostraram isso.

Não daria para dosar melhor os remédios, usando também medidas fiscais para conter o crescimento?

Não sei, acho que já passou do ponto. O governo já perdeu muito tempo, a demanda está muito aquecida. Quando não tem outro controle, a solução são os juros. E tem o mercado de trabalho. Para você ter uma ideia, quando o Lula tomou posse no segundo mandato, o desemprego era 12%. Uma taxa de 6% é incrível. Não tem mão de obra, aí começam a subir os salários. Você tem hoje sindicatos muitos fortes, que já estão fazendo grande pressão por aumentos salariais. E quando olha a inflação de serviços, que não é afetada pelo fator externo, a taxa anual de inflação já está acima de 6%.

Há pouco tempo havia grande estímulo fiscal ao mercado interno e agora passamos por altas nas taxas de juros para conter o crescimento…

A questão é que quem comanda a política monetária é diferente de quem comanda a política fiscal. Além do que, como estamos em um ano de eleição, e o presidente quer ganhar a eleição, o gasto está muito acima. Sobraram os juros e a dosagem vai depender apenas da evolução da questão externa.

Por Luiz Carlos Mendonça de Barros
Fonte: O Estado de São Paulo – 10/06/2010